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sábado, 9 de maio de 2009

Corredor da vida... vida?


Nos dias imediatamente depois da cirurgia, em que PP ainda não podia sequer ser removido para a UTI, em uma das visitas, encontramos uma família chorando. Nossa entrada ao recinto foi adiada e, depois de meia hora de muita expectativa, nos informaram que o tempo de visita fora reduzido a apenas dez minutos pois um dos pacientes teve morte encefálica e aguardava ali a decisão sobre doação de órgaos. Creio que estavam ali mais 4 pessoas recém- operadas "da cabeça".

Estávamos como que anestesiadas, minha filha e eu, para atravessarmos os dias seguintes. Finalmente, na manhã de sábado, um dia antes de completar uma semana de cirurgia, PP foi para a UTI, que funciona em outro prédio.
Como o horário era diferenciado e não nos avisaram da transferência, perdemos a viagem naquela manhã. Encontramos um casal de amigos que chegara pouco antes para prestar solidariedade. Sem saber detalhes da situação, nos falaram muito cautelosamente: "Ele foi pra Uti". Aí explicamos do que se tratava. Antes, ele estava em um setor mais emergencial ainda. Essa terrível sigla não indicava piora nas condições e sim acomodação em instalações mais adequadas, que já aguardávamos há dias.

CTI ou UTI... Siglas terríveis cujo sentido só fui aprender perto dos meus 50 anos.
Duas vezes por dia, durante meia hora, o momento das famílias e amigos mais próximos constatarem que aquela pessoa continua ali. Primeiro passo: o nome no terminal de computador para recebermos os cartões dos visitantes. Dois para cada paciente. Depois, a angustiante espera pela liberação do recinto naquele período. De repente, demora de alguns minutos. Dez, quinze... O motivo: um óbito.
Na porta, uma auxiliar de enfermagem faz a chamada dos nomes de pacientes liberados para receber as visitas. Alguns não são chamados... O coração dispara. E às vezes é um motivo banal: "ele foi agora para tomografia". 

Em uma tarde de domingo, o nome do PP não foi anunciado na chamada. Em vez disso, veio o aviso: "Familiares do sr Paulo, aguardem um pouco". Pergunto o motivo. E a resposta: "acho que estão trocando..." Mais meia hora, quase termina o horário convencional e nada. Insisto em saber. E a resposta: "provavelmente estão dando banho". 
Depois de minutos que pareceram eternidade, nos chamam. Lavamos as mãos, vestimos o avental e atravessamos o corredor quase que correndo. Ao chegarmos ao boxe dele, que era o último, encontramos um técnicocom um aparelho que até então desconhecíamos, em um carrinho. Notamos adesivos no peito do PP e marcas vermelhas. 
Perguntamos do que se trata. E o funcionário, laconicamente: 
"O médico vai explicar".

Rezamos, conversamos, seguramos nas mãos inertes do PP. Da nuca saía um canudinho transparente, de onde drenava um sangue aguado.
Notamos que os números que monitoravam oscilavam muito. Às vezes algum aparelho apitava. De vez em quando, os ombros se agitavam, com movimentos que pareciam tremores. Nos animamos: "Ele está reagindo!" - pensamos.
Dali a pouco, o boletim, dado por uma jovem residente, muito nervosa: 
"Ele sofreu uma arritimia cardíaca importante. Os batimentos oscilaram de 50 a 200. Tivemos de usar o desfibrilador."
E a gente, na nossas esperançosa inocência:
"Mas ele tá começando a se mexer..."
E a médica:
"Isso é involuntário. Mal sinal, que chamamos de descerebração. É quando os músculos passam sinais sem transitar pelo cérebro. O corpo pode estar se desligando do cérebro..."

Entre as frases duras, contundentes, massacrantes, que parecem até sarcásticas, ouvimos:
 "Este hospital tem 2.000 leitos para doentes, e aqui, nestes 15, estão os casos mais graves. Os mais graves dos graves."
Outra frase: 
 "Só por milagre... e eu não acredito em milagres!"


Um comentário:

MAF disse...

A minha mulher teve um AVC hemorrágico em 29 de Junho de 2011. Estou a ler agora este post pela primeira vez e estou impressionado. Estou impressionado pelas semelhanças com a minha situação. Quase parece que é o relato do que eu vivi, aqui em Lisboa. Verdedeiramente impressionante. A minha mulher também sobreviveu, e está hoje em recuperação. Mais tarde enviarei também um post para o site, contando o detalhe da minha situação e do que estou a viver. Parabéns ao site.

Mário A Florentino
maflorentino@gmail.com

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